Chávez intervém em banco ligado a TV

Chávez intervém em banco ligado a TV
Presidente de instituição diz que o governo venezuelano quer obrigar a opositora Globovisión a «ajoelhar-se’

Na sexta, Justiça havia decretado prisão de dono da emissora, que está foragido e afirma que não vai se entregar

FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS

O governo da Venezuela interveio ontem no Banco Federal, cujo presidente é acionista do canal Globovisión, crítico ferrenho de Hugo Chávez. A superintendência estatal de bancos alegou que a instituição tinha problemas de liquidez e que havia indícios de irregularidades.
A ação acontece apenas três dias depois de a Justiça determinar a prisão de Guillermo Zuloaga, presidente da Globovisión, e de seu filho. Não se sabe o paradeiro de ambos, acusados de «usura genérica» e de formação de quadrilha por suposta ocultação de 24 veículos.
Ontem, o presidente do Banco Federal, Nelson Mezerhane, afirmou em entrevista à Globovisión que as acusações de falta de liquidez do banco «são totalmente falsas» e acusou o governo de querer obrigar a TV a «ajoelhar-se». Disse ainda que funcionários de Chávez teriam tentado comprar a TV, a única de aberta oposição ao governo no ar no país.
Já Zuloaga falou pela primeira vez desde sexta-feira, quando foi decretada sua ordem de prisão. Afirmou que não se entregará à Justiça.
«Se me entregasse não faria nenhum favor nem a mim, nem ao país, nem à minha família», disse à Globovisión, alegando que apenas cederia a «chantagem» do governo que quer calar a TV e «distrair a população» dos problemas do país.
A ordem de detenção de Zuloaga foi condenada ontem pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), ligada à OEA (Organização dos Estados Americanos). Já havia sido criticada na sexta pela Sociedade Interamericana de Imprensa.
O Departamento de Estado americano demonstrou «preocupação» e ligou a ação a outros supostos ataques do governo venezuelano à liberdade de expressão.
Em nota assinada pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro e pela colombiana Catalina Botero, a CIDH criticou o «consenso» entre os Poderes na Venezuela e falta de independência do Judiciário.
A comissão também critica a condenação a três anos de prisão, também na sexta, de um jornalista da cidade de Valência, após ter escrito coluna sobre suposto ato de corrupção do prefeito chavista da cidade.
O texto enviado ao governo Chávez lembrou que a ação contra o presidente da Globovisión ocorreu poucos dias após o próprio presidente venezuelano queixar-se, em cadeia de rádio e TV, que o empresário seguisse livre após a acusação de usura.
Em março, Zuloaga foi detido por algumas horas e impedido de deixar o país, acusado de «vilipendiar» a figura do presidente em um evento em Aruba, em fevereiro.

CRISE CAMBIAL
Se a ordem de prisão de Zuloaga e seu filho foi amplamente criticada, a intervenção no Banco Federal, mediano no mercado venezuelano, foi respaldada pela associação de bancos privados.
A intervenção no banco (com 152 agências) traz nervosismo em meio à instalação de um novo esquema de transação cambiária, que estreou na semana passada.
Anteontem, Chávez ameaçou tirar todos os depósitos estatais da banca privada.
Em novembro passado, o governo já havia tomado o controle de nove pequenos bancos -a maioria de banqueiros próximos do chavismo- sob acusação de fraude. Vários envolvidos estão presos, outros foragidos.
O Estado controla agora 26% da banca, segundo cálculos de economistas locais.

(Fuente: Folha de S. Paulo de 15 de junio de 2010, cuaderno Mundo)

Alternativas a Chávez

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Presidente da Venezuela insiste na polarização do país, mas surgimento de partido moderado indica que tática pode ser superada
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Ao manipular a Justiça da Venezuela e determinar a prisão do presidente da TV Globovisión, canal crítico ao governo, Hugo Chávez mais uma vez se valeu, na semana passada, de sua principal tática política. O incitamento à polarização da sociedade venezuelana, dividida entre aliados e inimigos do regime, tem permitido ao mandatário galvanizar expressivo apoio popular, aumentar o controle sobre as frágeis instituições do país e arregimentar uma milícia que age como guarda pretoriana.
A confluência de crescentes dificuldades econômicas e um decisivo pleito para renovar a composição da Assembleia Legislativa, a ser realizado em setembro, devem tornar cada vez mais frequentes atitudes intimidatórias e diversionistas por parte do caudilho.
O PIB encolheu quase 6% no primeiro trimestre do ano; e a inflação, até maio, já acumulava alta de 14%. Os dois péssimos resultados se combinam para deprimir a renda dos venezuelanos.
Carente de recursos, o governo também tem sido obrigado a flexibilizar sua política de valorização artificial da moeda.
Por anos perdurou uma cotação oficial do dólar que elevava o poder aquisitivo da população -num país em que a maior parte dos produtos de consumo é importada. O custo era arcado pelo governo e pela estatal petrolífera, a PDVSA, que viam reduzidas as receitas advindas da exportação do petróleo.
A crise econômica mundial, o recuo nos preços da commodity e a ineficiência administrativa do chavismo impediram a manutenção do populismo cambial.
A soma de problemas tem cobrado seu preço político. Pesquisas indicam que a popularidade do governo caiu da casa dos 70% para oscilar, nos últimos dois anos, entre 40% e 50%.
Em meio às dificuldades, aumentam as chances de mudança. Antes de tudo porque a oposição não repetirá, nas eleições legislativas de setembro, a estapafúrdia estratégia de 2005, quando abandonou a disputa.
Mas a principal notícia nesse front vem de um grupo de dissidentes do chavismo, liderado pelo governador do Estado de Lara, Henri Falcón. Sua nova legenda, Pátria Para Todos, defende o rompimento com a lógica política polarizada que divide o país.
Falcón elogia a elevação do padrão de vida da parcela mais pobre da população sob Hugo Chávez, mas condena o militarismo do mandatário, as arbitrariedades do governo, o ambiente de insegurança jurídica e a perseguição à iniciativa privada.
É improvável que a nova força suplante os chavistas e os opositores tradicionais na composição da Assembleia. Mas o real exercício democrático depende da consolidação de partidos moderados, capazes de negociar e fazer concessões. O simples surgimento de uma legenda centrista já deve ser saudado como um avanço na política do país vizinho.

(Fuente: Folha de S. Paulo de 15 de junio de 2010, cuaderno Opinião)

Clichês dão a argentino tom de comercial de aposentadoria

Clichês dão a argentino tom de comercial de aposentadoria
Divulgação

Celeste Cid como a atendente de telemarketing Clara no longa do diretor Mariano Mucci

ANDRÉ BARCINSKI
CRÍTICO DA FOLHA

Filmes ruins sempre existiram. Só que, antigamente, cada país os fazia a seu modo. Hoje, com o tal «cinema globalizado», os filmes continuam ruins, mas são idênticos em toda parte.
A comédia romântica «Alguns Motivos Para Não Se Apaixonar» foi feita na Argentina, mas poderia ser canadense, brasileira ou sueca.
O que prova que a estética de filme publicitário e as piadas recicladas de séries de TV americanas são mesmo uma praga global.
O filme abusa da surrada história da jovem que se apaixona por um homem mais velho. Clara é atendente de telemarketing e conhece um viúvo cinquentão, Axel.
Os personagens são aqueles estereótipos de sempre: Clara é uma menina atrapalhada e azarada no amor. Já Axel é um viúvo melancólico que tem uma tartaruga de estimação (ele é um sujeito «devagar», sacou?).
Sucedem-se cenas que já viraram clichês do gênero: Clara chega mais cedo em casa e surpreende o namorado na cama com a melhor amiga; Axel é agarrado por uma vizinha fogosa no exato instante em que Clara chega e por aí vai. Uma zorra total.
Como reza o manual das comédias românticas, esta também tem seus momentos de «reflexão» em que os personagens contemplam o mar, abraçados, enquanto uma típica baladinha pop toca ao fundo.
Parece comercial de plano de aposentadoria ou de remédio para disfunção erétil.

(Fuente: Folha de S. Paulo de 15 de junio de 2010, cuaderno Acontece)

Mostra expõe ousadia tropical em Madri

Mostra expõe ousadia tropical em Madri
«Desvios da Deriva» traz visão alternativa de brasileiros e chilenos à arquitetura modernista e racionalista

FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

«Eu era arquiteto e mudei para a arquitetura da imaginação», conta o artista Roberto Matta (1911-2002), num depoimento em vídeo, incluído na mostra «Desvios da Deriva. Experiências, Travessias e Morfologias», com curadoria da brasileira Lisette Lagnado, no Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofía, em Madri, em cartaz até 23 de agosto.
A tensão entre a prática da arquitetura e uma visão tão criativa que se torna mera utopia marca a exposição através de dois grupos de artistas-arquitetos: os brasileiros Lina Bo Bardi, Flávio de Carvalho e Sérgio Bernadores, e os chilenos que, além de Matta, são representados por Juan Borchers e o grupo da Escola de Valparaíso.
A sessão chilena tem curadoria de Maria Berrios. Pontua ainda a mostra uma série de desenhos feitos pelo arquiteto francês Le Corbusier (1887-1965), quando passou pelo Brasil em 1936. Le Corbusier é visto na mostra como uma figura visionária, no sentido da busca de uma arquitetura não apenas marcadas pelas linhas racionais, mas também por uma visão orgânica da construção e da busca do diálogo com o contexto.
Além de ter influenciado grande parte da arquitetura brasileira, por conta de suas constantes visitas ao país, na mostra explicitado por seus desenhos apresentados numa conferência em 1936, Le Corbusier ainda abrigou Matta em seu escritório.

DESTAQUES
Construída por meio de elegantes estantes, em vez de paredes, a cenografia da exposição, assinada pela arquiteta Aurora Herrera em parceria com Lisette Lagnado, é marcada pela transparência, já que todos os móveis são vazados.
O grande destaque da encenação da mostra, contudo, é um dispositivo criado pela artista francesa Dominique Gonzalez-Foester, pelo qual o famoso conjunto de saia e blusa New Look para Verão, de Flávio de Carvalho, desfila pela exposição pendurado em um cabide.
Com cerca de 200 obras, entre maquetes, desenhos e documentos, «Desvios da Deriva» apresenta uma visão de alternativas, no Brasil e no Chile, ao modernismo racionalista, ao mostrar que a utopia nos trópicos não era uma meta distante, mas consistia na concepção de projetos que respeitavam o ambiente e a escala humana.
Nesse sentido, Bo Bardi se converte num dos grandes ícones da exposição, por viabilizar projetos inovadores como o Masp, a restauração do Museu de Arte Moderna da Bahia e o Sesc Pompeia.
E Flávio de Carvalho, que na mostra do MAM de São Paulo parecia tão pacato, surge de fato como o «revolucionário romântico», apelido pelo qual era chamado por Le Corbusier.

O jornalista FABIO CYPRIANO viajou a convite do Centro Oficial de Turismo Espanhol, da Photoespaña, da Iberia e da Travel Ace

(Fuente: Folha de S. Paulo 12 de junio de 2010, cuaderno Ilustrada)

Chávez anuncia fim parcial dos apagões

Chávez anuncia fim parcial dos apagões
Dias após ampliar emergência energética, líder susta racionamento em vários Estados

DE CARACAS

Dois dias após decretar a prorrogação da emergência energética no país, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, anunciou anteontem, na TV, o fim dos apagões programados em vários Estados do país.
Os cortes de até seis horas diárias vigoravam desde fevereiro -a exceção era a capital, Caracas- para economizar energia ante o risco de colapso da hidrelétrica de Guri, responsável por 73% do fornecimento energético.
Chávez disse que, com as chuvas recentes, a represa de Guri recuperou capacidade de geração, mas admitiu que o país ainda não está fora de risco e que cortes podem acontecer nas horas de pico.
Os consumidores públicos e privados seguem obrigados a reduzir em 10% o consumo, sob pena de multa, e o expediente do funcionalismo segue reduzido até 30 de julho.
A Venezuela não participa da Copa, mas o presidente disse que o torneio é um fator que pesou na hora de decretar o fim dos cortes.
Segundo ele, «sustentar os racionamentos por mais tempo, especialmente às vésperas do início do Mundial de futebol», teria «efeito negativo» na população.
A crise energética afeta o país desde novembro -é um dos fatores da queda 5,8% do PIB no primeiro trimestre.
O racionamento também provocou protestos em Caracas e no interior e afetou a popularidade do presidente, a poucos meses das eleições legislativas de setembro.
Para analistas do setor, além da seca, afetam o sistema elétrico falta de investimento e de manutenção.

(Fuente: Folha de S. Paulo 12 de junio de 2010, cuaderno Mundo)